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01. OS LIVROS

VOLUME 1

ELEIÇÕES, TRAPAÇAS
E CARROS
POSSANTES

Imaginem uma eleição típica com dois candidatos convencionais da esquerda e da direita, até que surge uma terceira opção impossível: um chefe do tráfico. Qual faria o melhor governo? Qual o mais perigoso entre os três?

VOLUME 2

O REVOLUCIONÁRIO,
A SURRA E OS FATOS
MAL PASSADOS

02. AS INSPIRAÇÕES

Meu interesse pela psicologia e pela psicanálise de um lado, e pela filosofia de outro, vem desde a época da faculdade de arquitetura. Consciente e inconsciente se enredando nos mistérios insondáveis da nossa mente. Me lembro da interpretação que meu terapeuta, na época, fez de um sonho que tive.

Eu estava no meu carro, porém no banco do passageiro, havia a motorista, uma mulher que eu não conhecia e outros personagens no banco de trás, todos falando muito e sem parar. Meu terapeuta propôs “e se pensarmos esse carro como uma metáfora da sua mente, o que parece ser você é sua consciência, os outros são manifestações de seu inconsciente”?

Gostei da proposta, e rapidamente tive de concluir que, nesse caso, minha consciência não estava dirigindo o carro! Depois avancei naquele exercício, e se nossas histórias pessoais ou mesmo coletivas forem uma metáfora dessa luta desarvorada por poder que os diversos Eus travam por nossas vidas a fora?

E se os chamados excluídos, aqueles que nem sabemos que existem, tiverem muito mais poder do que nossa consciência gosta de admitir? E se o Vazio, na sua infinita humildade, for muito mais importante que a Matéria, com toda a sua soberba e prepotência? Última pergunta: quem diabos está de verdade dirigindo o carro?

Graças a minha mãe, a biblioteca na casa onde eu cresci era farta. Vários milhares de livros juntados ao longo de duas gerações de Brasil. Um deles em particular me marcou muito, desde a primeira vez que eu o tive em mãos aos 7 anos de idade, curiosamente muitos anos antes de eu saber o que estava escrito nele.

Era a Divina Comédia, de Dante Aligheri, uma edição italiana do século XIX. Minha avó arrematou em leilão em 1.932 que, de acordo com escrito em caneta tinteiro na primeira página, foi organizado com a finalidade de arrecadar fundos para as tropas paulistas, por ocasião da Revolução Constitucionalista ocorrida no mesmo ano. Minha avó quis contribuir e comprou o livro.

Como não sei falar italiano, só vim a conhecer o maravilhoso poema de Dante muito tempo depois, através de uma versão em português . Mas as figuras… eram litogravuras feitas por Gustavo Doré, francês, um dos maiores ilustradores de todos os tempos. E que pareceu tê-las feito junto com a redação por Dante, um trabalho a quatro mãos separadas, no entanto, por cinco séculos (a Divina Comédia foi escrita no século XIV). Tendo folheado suas páginas incontáves vezes, quase decorei todas aquelas ilustrações que me inspiraram tanto terror quanto fascinação.

Nunca me esquecerei da atmosfera fantástica, mágica, solene daquele passeio de Dante, na companhia de Virgílio e depois Beatriz, pelos ciclos do inferno, o purgatório e o paraíso, ouvindo dezenas de testemunhos de pessoas comuns em penitências inimagináveis por terem sucumbido aos mais variados pecados.

Nasci e vivi em São Paulo a minha vida toda. Sempre que algum amigo me comentava encantado sua viagem recente a Nova Iorque, eu dizia “se é para ser grande e feia, eu prefiro São Paulo, que é maior e mil vezes mais feia que Nova Iorque”. Era e é o meu jeito torto de dizer o quanto amo minha cidade.

E o quanto a odeio, também. O fato é que já dei minhas voltas pelo mundo. São Paulo é todas as capitais numa só. De Paris a Bagdá, passando por Monróvia (capital da Libéria). Claro, não deixa de ser uma metrópole do terceiro mundo. Mas com que contrastes! E com que personagens! O Hélio da banca, o Ferreira da padaria, o menino que lavava os vidros no farol (a quem dei 500 reais para pagar uma promessa), a Norminha travesti que sempre gentilmente nos abria o portão quando chegávamos de carro (no tempo que os portões não tinham mil cadeados).

Para resumir, patriotismo é uma palavra com significado um tanto nebuloso, exceto quando penso na minha rua, no meu bairro. Na minha cidade.

São Paulo, megalópole: em março de 2006, às 22 horas, eu caminhava
sozinho com meus dois cachorros. Quando digo sozinho, quero dizer realmente sozinho. No que parecia um episódio maluco de Além da Imaginação, eu caminhava pelo meio da rua Artur de Azevedo, o que numa noite normal seria altamente desaconselhável.

Mas não naquela noite. Não havia nenhum carro estacionado ou circulando, nenhum ser humano até onde minha vista podia alcançar.

Ninguém sabia direito, mas supostamente o PCC estava por trás daquele inacreditável ataque, como retaliação pelo sei lá o que, que já não interessa mais. Uma ação conjunta e sincronizada de centenas de ataques a departamentos de polícia, corpos de bombeiros, agências bancárias ao longo de 48 horas de puro terror para a sociedade comum.

Arrastões de dezenas de criminosos em plena luz do dia, obrigando ruas comerciais inteiras a fechar as portas.Todos estavam aterrorizados. E eu, que em condições normais de pressão e temperatura sou o mais banana e covarde entre todos, pensava absolutamente puto, isso não está certo, eles não podem fazer isso conosco. Essa cidade é nossa. Daí meu passeio solitário as dez da noite.

Jurei a mim mesmo que nunca me esqueceria desse dia. E que algum dia eu ainda escreveria essa estória de alguma forma.

03. A TRILHA SONORA

Para aprimorar a experiencia de leitura de Não Branco Não Homem, eu lançei também o álbum instrumental Trilhas para lugar nenhum. São 12 faixas compostas por mim que vão do clássico ao jazz a um mix de suspense, mistério e bom-humor. O álbum conta com a participação de Vicente Falek, Luís Paulo Serafim e Alexandre Guerra.

O que a minha avó tem a ver com a capa do álbum?

Videoclipes das músicas